Motonáutica arrasta multidão para o lago da Marina em Abdon Batista |
Vermelhão, a fortaleza (quase) intransponível
O Vermelhão foi a fortaleza instransponível da minha infância. Eu morava longe do local - que serviu como estádio do Inter de Lages e na primeira metade dos anos 1980 se transformou em sede social do clube -, mas como tinha primos e tios que moravam na vizinhança, e como era com eles que gastava o ócio das minhas tardes ao longo da semana, o Vermelhão povoava meus passatempos de guri.
Na verdade, a parte que cabia ao Vermelhão em minhas diligências verpertinas nas cercanias da rua Marechal Deodoro, endereço da antiga casa colorada, era, na verdade, a da ausência. Ao contrário da família de meus primos, nosso núcleo familiar - pai, mãe e dois irmãos mais novos, além de mim - não era sócio do Inter, o que, de saída, me privava de participar daquele ambiente que tanta curiosidade me despertava.
Não que isso tenha ficado para mim como uma recordação melancólica de privações ou qualquer coisa dessas. Nada disso. Primeiro, a restrição me ajudou a desenvolver uma cara de pau que, confesso, nunca foi meu forte. Instruído por meus primos, eu me misturava na confusão de gente que era a entrada do Vermelhão em dias de sol, assentia com a cabeça quando um deles dizia ao porteiro que eu havia esquecido a carteirinha em casa e torcia pelo melhor. Nem sempre tínhamos sucesso na traquinagem, mas às vezes dava certo.
Em épocas fora da temporada de piscinas, me agradava dissecar os muros maltratados do Vermelhão para achar falhas que me permitissem ver o que se passava lá dentro. Essas incursões de Sherlock da Cândido Ramos eram especialmente atraentes quando eu sabia que o time estava em treinamento durante as disputas do Campeonato Catarinense.
Anos atrás, quando Mauricio Neves de Jesus me apresentou os originais de "Aquelas Camisas Vermelhas", livro sobre a história do Inter que o autor lançou em 2012, eu fiquei particularmente intrigado com uma das fotos que registram a inauguração do parque aquático do Vermelhão, em 1984. Foi um ato que atraiu bom público e que atestou o prestígio do clube - na imagem aparece a reluzente e inconfudível careca do então governador Esperidião Amin, além de todas as autoridades de primeiro escalão da cidade nessa época.
Se coração de mãe não se engana, então creio que já posso decretar aqui uma descoberta que já dividi em caráter privado com algumas pessoas: o menino em primeiro plano na foto em questão (abaixo), atestou minha mãe dia desses, sou eu. Na inauguração do Vermelhão, consegui invadir o clube que eu tanto queria ver, e nesse dia a timidez e a ausência de carteirinha de sócio não me barraram.
Só com o Inter de Lages em nossas vidas é possível a "autorredescoberta" de um Sherlock infantil que ia perscrutar os muros da fortaleza do Vermelhão para ver o time em que, sem perceber, ele enxergava como um pedaço de si próprio. É bom viver, não?
Deixe seu comentário